Coluna

Moises Rabinocivi: Hamas deve rejeitar acordo de cessar-fogo

Colunista do BandNews TV comenta possível rejeição do Hamas em relação ao acordo

Modelo

Moises Rabinovici

03/05/2024 14:59

GIRO MOISES

Coluna

O Hamas não respondeu ainda, oficialmente, o que rejeita no último acordo egípcio-israelense-estadunidense, cujo prazo foi encerrado na última segunda-feira. Se o aceitasse, já o teria respondido. Israel vai esperar mais uma semana.


Pelos porta-vozes do Hamas no Líbano e no Catar, sabe-se que o líder Yahya Sinwar quer o fim da guerra garantido no acordo, enquanto o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu diz que nada o fará desistir de um ataque a Rafah, o último bastião de Gaza ainda não conquistado por Israel, defendido por quatro batalhões dos 24 que existiam antes do início da guerra.


O Hamas só lucra não tendo pressa. A causa palestina ganhou os universitários americanos, canadenses e franceses. O sofrimento dos palestinos impactou o mundo. As famílias dos reféns em Gaza pressionam o governo israelense a fechar qualquer acordo para trazê-los de volta. E os Estados Unidos estão contra uma ofensiva em Rafah, que vai expor milhares de palestinos civis indefesos a bombardeios aéreos e à artilharia.

O Wall Street Journal antecipou: “Espera-se que Sinwar rejeite qualquer acordo que não inclua um caminho credível para acabar com a guerra”.


O Canal 12, de Israel, divulgou três exigências específicas do Hamas: 1) “mudar completamente” a cláusula que prevê “calma sustentável” por “uma obrigação por escrito para o fim incondicional dos combates”. 2) Retirar de Israel o direito de impedir a entrada de prisioneiros palestinos libertados na Cisjordânia, enviando-os para Gaza ou exterior. 3) Ser informado sobre os materiais que não serão permitidos para a reconstrução de Gaza — aqui, talvez, já planejando a reabertura dos túneis destruídos por Israel.


O governo americano considerou a última proposta “generosa” por atender a grande parte das exigências do Hamas em rodadas anteriores de negociação. E está culpando o Hamas de “ser a única barreira para um cessar-fogo”. Se o acordo for aceito, Israel o aprovará oficialmente? Não está claro, porque os ministros da extrema direita que são parte da coalizão ameaçam abandonar o governo, provocando a sua queda. Para eles, um acordo será “a rendição ao terror”.


210 dias de guerra. Pelos cálculos israelenses, restam 129 reféns em Gaza, depois de libertados 105 em novembro, outros 4 antes, por questões humanitárias, e 3 que foram resgatados. Os mortos palestinos estão perto de 35 mil, incluindo 13 mil que Israel diz ter abatido. Em Gaza, 370 mil casas foram destruídas. Na quinta-feira, os Estados Unidos derrubaram três mísseis disparados pelos Houtis, no Iêmen, e o grupo Resistência Islâmica, do Iraque, divulgou um vídeo com um ataque de dois mísseis cruzeiros contra alvos israelenses, inclusive Tel Aviv. Não se sabe se chegaram. Não houve visível destruição em Israel e o porta-voz militar nada informou ou comentou.


(Jornais israelenses em inglês desta sexta-feira)

_______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________


“A Primeira Vítima”, no livro de Phillip Knightley, “é a verdade”. Mas nos 210 dias da guerra em Gaza, as principais vítimas, além dos 35 mil mortos palestinos contados pelo Ministério de Saúde do Hamas, foram jornalistas, justamente os responsáveis por filtrar a verdade nas áreas de batalha. Mais de cem morreram.


Hoje, Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, aos jornalistas palestinos foi atribuído o prêmio Liberdade de Imprensa, pela UNESCO. Eles são a maioria entre os jornalistas mortos no mundo inteiro em 2023.


A Faixa de Gaza está fechada para os correspondentes internacionais desde o primeiro dia da guerra, em 7 de outubro de 2023. Reportam de lá os jornalistas palestinos ou agências de notícias baseadas na cidade, com equipes de fora. Jornais importantes do mundo todo compram o material desses informantes palestinos, a que chamam de stringers.


No dia em que o Hamas invadiu Israel, em 7 de outubro, alguns fotógrafos de Gaza foram avisados. Daí surgiram as fotos de terroristas comemorando a invasão em cima de tanques israelenses capturados. Para militares israelenses, se eles souberam antes do que era um segredo militar, seriam mais cúmplices do que jornalistas. E pediu às agências que compraram as fotos que os demitissem.

Aqui, teve início o que foi a causa mortis de muitos dos mais de cem jornalistas mortos em Gaza. Israel justificava as mortes dizendo que, na verdade, atirou em terroristas, só depois sabendo que entre eles havia alguém da imprensa, normalmente vestido com colete a prova de balas em que se lia em letras garrafais: PRESS.


Assim foi justificada a morte de Hamza Wael Dahdouh, filho do correspondente da Al Jazeera, Wael Al-Dahdouh: ele estava num carro com um homem que operava um drone para o Hamas, em 7 de janeiro. Outro jornalista no mesmo carro, o operador de vídeo Mustafa Thuria, a serviço da Agência France Press, foi morto também.


Al-Dahdouh enterrou o filho e voltou a trabalhar. Ele já tinha perdido a esposa, dois outros filhos e o neto na mesma guerra. “O mundo todo deve olhar o que está acontecendo em Gaza”, ele disse. “O que acontece é uma grande injustiça contra o povo indefeso. É também injusto para nós, jornalistas”. Às críticas, o porta-voz militar divulgou um comunicado: “As IDF (Forças de Defesa de Israel) não visam jornalistas de forma propositada e tomam medidas para mitigar danos não intencionais a jornalistas e a todos os civis". E acrescenta: “As forças armadas estão visando todas as atividades militares do Hamas em Gaza", o que implica "ataques de alta intensidade, que podem causar danos em edifícios e áreas circundantes”.


A Al Jazeera não aceitou a explicação e a rebateu, acusando Israel de "violar os princípios da liberdade de imprensa" e de “visar deliberadamente os jornalistas”. Havia um precedente, anterior à guerra em Gaza: a morte de Shireen Abu Akleh, em Jenin, na Cisjordânia. Além de palestina, ela tinha nacionalidade americana. A Al Jazeera, a organização jornalística que mais perdeu jornalistas na guerra, iniciou uma investigação independente contra Israel na Corte Criminal Internacional de Haia, na Holanda, onde também a Ong Repórteres Sem Fronteira prestou queixa. O Comitê para a Proteção a Jornalistas, em Nova York, classificou 43 das primeiras 50 mortes em Gaza como resultado de “missão perigosa”. Ela está investigando cada caso.


A guerra em Gaza é a cobertura mais mortífera para jornalistas em zonas de conflito no século XXI. Mais do que na América do Sul, onde se sobressai o México; no Afeganistão, no Iraque, em Ruanda, na Ucrânia e na guerra do Líbano, que cobri, em 1982, para jornais brasileiros. Então, para não ser alvo de aviões israelenses, recebia uma toalha para pôr no teto do carro. Cada dia ela mudava de cor. Era a informação para os pilotos: carro de jornalista.


MAIS NOTÍCIAS